João Caetano
em
Sep 28, 2022
O terceiro lugar

Um lugar para chamar de nosso

Conheça um conceito que traz bons resultados para redes como o Starbucks e Bacio di Latte.

Nossa vida é marcada pelos lugares por onde passamos, pelo reflexo dos papéis que esses lugares tiveram nela.

Enquanto bebês, nossa casa era o mundo todo.

Ao crescermos vamos incorporando outros lugares ao cotidiano. 

Primeiro vamos à creche e escola, depois aos cursos extracurriculares e profissionalizantes, até entrarmos no mundo do trabalho. 

Muita gente se refere à universidade em que estudou como Alma Mater, que em latim significa mãe que cuida, simbolizando a importância que aquele lugar teve para suas vidas.

1° - A casa figura como lugar principal, ela é a base para o viver, daí seu título de Primeiro Lugar, algo como o espaço mais importante.

2º - Na sequência temos o trabalho, onde realizamos atividades profissionais que sustentam o viver, sendo o Segundo Lugar ou o segundo espaço mais importante.

3º - Tanto em casa quanto no trabalho existe o convívio com outras pessoas, mas como parentes e colegas de trabalho a gente não escolhe, fica faltando um lugar para convivermos com as pessoas que podemos escolher, o que seria nosso Terceiro Lugar. 

Como na canção Comida, dos Titãs:

A gente não quer só comer

A gente quer prazer

Pra aliviar a dor

A gente não quer

Só dinheiro

A gente quer dinheiro

E felicidade

Na busca pelo prazer e pela felicidade, procuramos por pessoas com as quais possamos estabelecer relações de amor e amizade. 

Onde é possível encontrar e conviver com essas pessoas?

Você deve pensar nos diversos lugares onde ocorrem esses encontros, bares, igrejas, academias, livrarias, cafés, clubes, parques, sorveterias, praças, tabacarias, restaurantes.

Um bar, um café ou uma sorveteria não são por si um lugar de encontros e convívio, é preciso que favoreçam os encontros e o convívio.

Uma academia pode ser um ótimo ponto de encontro de pessoas orientadas à saúde e bem estar, mas nem todas são. 

O formato de academias-fit, por exemplo, privilegia a prática de exercícios em detrimento do convívio, sem que haja um espaço onde a interação seja valorizada. 

No seriado Friends havia um lugar em que todos se encontravam sem combinar, era o Central Perk, quase um personagem na divertida série. 

Little Owl Cafe New York City Friends Central Perk coffee
PHOTO: ALICE S. HALL/NBC/NBCU PHOTO BANK VIA GETTY IMAGES

Os personagens da série Seinfeld faziam do restaurante do bairro uma extensão de suas casas.

Christophe Gevrey - Tom's Restaurant, in New York City, January 15th 2012 View from Broadway

Antes de Seinfeld e Friends havia a série Cheers, que em Portugal se chamava Aquele Bar, porque tudo se passava num bar em que a comunidade local se encontrava para falar da vida. 

Durou 11 temporadas, fazendo dela uma das séries mais longas da história da televisão, e ainda deu origem à famosa série Frasier

Sometimes you want to go 

Where everybody knows your name

And they're always glad you came

Às vezes queremos ir 

Aos lugares onde todos sabem nosso nome

E estão sempre felizes por termos ido

O conceito de Terceiro Lugar

Criado pelo sociólogo Ray Odenburg em 1989, enfatiza a importância dos espaços voltados para a expressão pessoal, troca de idéias, paqueras e amizades como parte central da vida humana. 

Foi assimilado pelos estudiosos de urbanismo, que se serviram do conceito para apontar problemas de convívio provocados pela estrutura das cidades voltadas inteiramente ao casa-trabalho-casa.  

O conceito foi usado para criticar regras de zoneamento que proibiam a existência de atividades comerciais em áreas residenciais, criando zonas mortas em termos de interação social.

Enquanto em outras áreas, essencialmente comerciais, existem bares, livrarias e academias, sem comunidades vizinhas que possam fazer deles seus Terceiros Lugares. 

Os tradicionais Pubs (Public Houses), que concentram diversos papéis em suas comunidades, recebendo correspondências, oferecendo refeições quentes e até pernoites, são um ótimo exemplo de Terceiro Lugar. 

“As lojas da Starbucks sempre foram conhecidas como o ‘terceiro lugar’, um local acolhedor fora de nossa casa e trabalho onde nos conectamos com uma xícara de café”

Kevin Johnson, CEO.

Como todo mundo guarda um lugar desse tipo no coração, é fácil concordar com a sua importância. 

O renovado papel dos Terceiros Lugares

No contexto das novas geografias econômicas aceleradas pela pandemia, os bairros crescem em importância em relação aos centros comerciais. 

Mais gente trabalhando em home office, atribuindo mais papéis à casa, que agora funciona como Primeiro e Segundo Lugar, aumentando ainda mais a demanda por um Terceiro Lugar que seja um alívio em relação aos dois primeiros. 

Crescem projetos de Coliving, que integram o Primeiro Lugar (Casa) com o Terceiro (Social), ou Coworking, que integram o Segundo Lugar (Trabalho) com o Terceiro (Social).  

Mesmo os Shopping Centers, que sempre tiveram uma função essencialmente comercial, agora buscam no formato multiuso a integração com espaços de trabalho e moradia para assumirem um papel de Terceiro Lugar.

A capacidade de retenção de clientes é a grande força que o conceito pode trazer para um negócio que tenha os elementos necessários para ser um Terceiro Lugar.

Esqueça a expressão giro de mesa ou giro de salão, que é a intenção de atender a diferentes clientes num intervalo de almoço ou jantar. 

Terceiros Lugares não esperam que o cliente entre consuma e saia, pelo contrário, esperam que entre, interaja e fique, isso pode ser até mais lucrativo.

O novo perfil de consumidor

Estruturas familiares menores, com mais adultos sem filhos, tiram o foco da casa, liberando as pessoas para atividades e interações. 

Se antes o consumidor até poderia preferir um atendimento rápido, para que pudesse voltar para casa ou trabalho, agora vemos a busca por espaços de imersão que sejam interessantes em si.

Casais sem filhos e pessoas vivendo sozinhas possuem mais renda disponível para consumo próprio, valorizando experiências enriquecedoras, a despeito de preços mais altos.

Gente interessante atrai gente interessante, por isso os Terceiros Lugares atraem esse público e lucram com ele, deixando para os demais lugares as pessoas cheias de pressa e desinteressadas. 

Ainda assim, é importante lembrar que essa demanda por Terceiros Lugares está mais concentrada em algumas regiões do que em outras onde o perfil familiar ou profissional são mais fortes. 

As informações de Moradores por Domicílio e População por Idade, oferecidas pela Mapfry em seu plano Público, permitem a clara distinção entre esses lugares.

Conheça o caso recente de um bairro de Porto Alegre que viu crescer um centro com perfil de Terceiro Lugar, partindo de um estudo de potencial que considerou critérios como tamanho da população, densidade de moradores e renda média, desenvolvido pelo especialista Francisco Zancan.

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